Ruanda procura benefícios económicos
O apoio militar do Ruanda no combate aos grupos insurgentes em Cabo Delgado tem motivações económicas e de afirmação da influência continental, considera uma análise do Instituto de Relações Internacionais Francês (Ifri).
A análise é intitulada “Diplomacia militar do Ruanda- O uso político de meios militares por Kigali visando aumentar o prestígio e a influência em África e além”.
Sobre a presença das Forças de Defesa do Ruanda (RDF, em inglês), o estudo não tem dúvidas:
“No caso de Moçambique, os acordos de segurança foram o prelúdio para o estabelecimento de parcerias económicas. Através das suas respectivas instituições, o Conselho de Desenvolvimento do Ruanda (RDB) e a Agência para a Promoção de Investimentos e Exportações (APIEX), os dois países assinaram um memorando de entendimento”, refere a análise, no capítulo sobre “Os motivos por detrás da diplomacia militar do Ruanda”.
Com o destacamento de tropas, primeiro, e a assinatura de um acordo na área económica, depois, o Ruanda abriu caminho para a presença do seu sector privado em Moçambique, prossegue o texto.
A análise observa que, no horizonte, o regime do Presidente Paul Kagame vislumbra em Moçambique oportunidades nos domínios de energia, agricultura e infra-estruturas, para os seus homens de negócios.
Nas conclusões da análise, o Ifri nota que os militares ruandeses têm conseguido sucesso no combate aos grupos armados que aterrorizam Cabo Delgado, enfatizando que o envio do contingente ruandês foi rápido e resultou de consensos entre dois homens: Paul Kagame e o seu homólogo moçambicano, Filipe Nyusi.
Ao contrário, a Missão Militar da SADC (SAMIM) foi lenta e burocrática, porque precisou do consenso dos estados membros da organização e, no caso de alguns países, de aprovação parlamentar.
“O caso de Moçambique realça diferentes níveis de eficácia entre as capacidades de resposta multilateral e bilateral. O envio da missão militar da SADC foi arrastado pela necessidade de consenso entre os membros, primeiro, e pelos paralisantes mecanismos burocráticos e institucionais. Contrariamente, o envio das tropas da RDF foi rápido, eficaz e baseado num consenso ao máximo nível de decisão e interesses recíprocos”, destaca-se no documento.
Com a sua presença militar em Cabo Delgado, o Ruanda mostrou a disposição para agir sozinho na sua intervenção no estrangeiro ou, pelo menos, que está em condições de actuar de forma independente de um quadro multilateral, que, no caso, seria com a SAMIM.
O modelo de intervenção militar do Ruanda em Moçambique é o mesmo que Kigali segue na República Centro Africana (RCA), assinala. O bem organizado contingente militar ruandês logrou resultados positivos na contenção de alguns grupos armados que operam na RCA e a sua presença no território deu argumentos a Paul Kagame para o estabelecimento de acordos no domínio econômico.
A aposta de Kagame na chamada diplomacia militar e o sucesso dai proveniente visa dar ao Ruanda a reputação de “provedor de segurança” para África.
Carências estruturais
O homem-forte do Ruanda e a sua “entourage” acreditam que o futuro da segurança do regime e do país está na estabilidade dos outros países africanos.
Por outro lado, com parceiros estáveis, será possível estabelecer e intensificar relações económicas e comerciais geradores de maior desenvolvimento económico para o Ruanda e outros países.
E com o desenvolvimento económico, virão também maiores garantias de segurança e sobrevivência do regime, refere a análise.
Paul Kagame vê no estreitamento dos laços económicos com outros países africanos um instrumento vital para o seu país vencer carências estruturais.
O Ruanda, prossegue, não dispõe de recursos naturais, como outras nações africanas, é um território pequeno e encravado e com escassa demografia.
Paul Kagame não está convencido da sustentabilidade dos factores que catalisaram o desenvolvimento social e económico do pequeno país nos últimos anos.
O investimento privado estrangeiro, observa Ifri, não é um motor de desenvolvimento fiável, a longo prazo, e é um elemento gerador de dependência e ameaça à segurança nacional do país.
No campo militar, o sucesso da tropa ruandesa no estrangeiro deve-se à experiência, profissionalismo e conhecimento de técnica de guerra assimétrica.
A eficácia das RDF em Cabo Delgado contra um grupo islamita extremista, em particular, fortaleceu a imagem do Ruanda como um país capaz de combater o terrorismo, mas também actuar de forma unilateral e eficaz.
O poderio militar do pequeno país tem atraído a atenção internacional, particularmente no ocidente.
Uma provável nomeação de um diplomata ruandês para liderar a Missão das Nações Unidas para a Estabilização da RCA (MINUSCA) pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, será mais um endosso à crescente influência internacional de Paul Kagame.
“O exército ruandês parece adequado para agir ao serviço de interesses internacionais na África Sub-sahariana, assumindo uma sintonia com os interesses de Kagame”, refere a análise.